Conto "Loucura", De Maurício Menossi Flores.


 

Loucura

(Conto em processo, sem revisão.)

 Era fim de tarde quando Jonas acordou em um lugar que não reconhecia. O ar tinha um cheiro de terra molhada, e o som de risadas distantes e murmúrios o envolvia como um estranho coro. Levantou-se devagar, sentindo a rigidez do corpo, e notou ao seu redor uma vila peculiar: pequenas casas alinhadas de forma irregular, todas pintadas com cal colorida — azul, amarelo, verde e rosa — formando um mosaico vivo e desconexo.

“Onde estou? ”, murmurou para si mesmo. A vila parecia encantada, mas algo de inquietante pairava no ar. As janelas das casas estavam abertas, mas ninguém aparecia à vista. Ele seguiu por uma viela estreita, sentindo os olhos o observarem das sombras.

Foi então que ele os viu. Pessoas caminhavam lentamente, algumas balbuciando coisas ininteligíveis, outras encarando o vazio com um olhar perdido. Jonas percebeu que não eram habitantes comuns; eram internos de um sanatório, abandonados à sua própria sorte em um espaço que não parecia ter um fim definido. Ele tentou falar com uma mulher de cabelos grisalhos, que segurava uma boneca como se fosse um bebê, mas ela apenas riu e se afastou.

Caminhando mais adiante, encontrou um homem sentado no chão, desenhando círculos com o dedo na poeira. Antes que Jonas pudesse perguntar algo, uma figura emergiu de uma das casas, um homem magro, com olhar febril e respiração ofegante. Ele carregava uma gilete entre os dedos, brilhando sob a luz do entardecer. O homem olhou para Jonas com uma expressão que misturava medo e agressão.

“Você está me espionando! ”, gritou ele, a voz tremendo de paranoia.

Jonas recuou instintivamente. “Calma, eu não… eu nem sei onde estou. ”

Mas o homem não ouviu. Avançou com rapidez surpreendente, a gilete brilhando como um raio. Jonas tentou se esquivar, mas o ataque foi preciso. Sentiu a lâmina atravessar sua camisa e cortar sua barriga. A dor veio imediata, quente e latejante.

Ele caiu de joelhos, pressionando a ferida enquanto o agressor fugia para as sombras, deixando para trás apenas seus murmúrios incompreensíveis. Alguns internos se aproximaram, mas nenhum parecia entender a gravidade do que acontecera. Jonas tentou pedir ajuda, mas as palavras se perderam em meio ao caos de risadas, choros e sussurros.

No meio da confusão, uma figura surgiu. Era uma mulher de aparência serena, usando um vestido branco que contrastava com as cores vibrantes da vila. Ela se ajoelhou ao lado de Jonas e tocou sua testa com delicadeza.

“Você precisa sair daqui”, disse ela, com uma voz tão calma que parecia um antídoto para o desespero que o consumia.

Jonas tentou perguntar como, mas ela apenas sorriu e apontou para o horizonte. Apesar da dor e da confusão, ele sentiu um estranho impulso de seguir na direção indicada. Cambaleando, reuniu suas últimas forças e caminhou, deixando para trás a vila de cores e loucura.

Quando finalmente atravessou o portão enferrujado que marcava o limite da vila, sentiu o mundo mudar. A dor na barriga desapareceu, assim como o sangue em suas mãos. Olhou para trás, mas a vila havia sumido, deixando apenas um campo vazio e silencioso.

Jonas nunca soube se aquilo fora um delírio, um pesadelo ou algo mais. Mas sabia que carregaria para sempre a marca invisível daquele encontro — um corte profundo na alma, mais do que no corpo.

 Maurício Menossi Flores

 


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